04 dezembro 2007

Salão Olímpico: 2003 – 2006

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Salão Olímpico: 2003 – 2006
por
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Miguel Amado:
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"No Verão passado, o suplemento “Ípsilon” do jornal Público dedicou sete páginas ao que designou por cena artística ´off`, ´indie`, ´undeground `, do Porto. Apesar de a reportagem pecar por tardia, já que a dinâmica dos espaços expositivos alternativos ao circuito comercial verificada no Porto é, desde inícios desta década, um fenómeno evidente, saliente-se o interesse demonstrado por um órgão de comunicação social mainstream por um assunto circunscrito ao especializado círculo das artes plásticas. Um dos responsáveis por esta conjuntura – e, de acordo com algumas opiniões, provavelmente pela sua corrente desaceleração ou, pelo menos, menor eficácia – foi o “Salão Olímpico”, cujo ciclo de exposições desenvolvido na cave de um café da Rua Miguel Bombarda, entre inícios de 2003 e fim de 2005, chamou a atenção para um conjunto de artistas, maioritariamente formados no Porto, que tomaram em suas mãos os meios de produção necessários à apresentação pública do seu trabalho. É certo que o “Salão Olímpico” seguiu os passos anteriormente dados por outras estruturas informais e que, entretanto, outros colectivos surgiram, pelo que a sua existência e o motivo da extinção da sua actividade apenas reflectem as vivências de um dado contexto. Contudo, note-se que o “Salão Olímpico” sempre ocupou um lugar central nesta situação, razão pela qual suscitou o interesse de duas instituições, o Museu de Arte Contemporânea de Serralves, no Porto, e o Centro Cultural Vila flor, em Guimarães, que promoveram a exposição “Busca Pólos” (dividida em duas partes, a primeira em Guimarães, a segunda em Coimbra, no Pavilhão Centro de Portugal), sintetizadora do modus operandi do “Salão Olímpico”. Na sequência deste evento, no qual os responsáveis do “Salão Olímpico” – Carla Filipe, Eduardo Matos, Isabel Ribeiro, Renato Ferrão e Rui Ribeiro (os quatro primeiros artistas) – expuseram, a par de alguns dos seus compagnons de route, que convidaram a também expor (tal como faziam no “Salão Olímpico”) editou-se Salão Olímpico: 2003 – 2006, espécie de livro memórias do projecto.
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De grande formato e com um grafismo radical chic, evocativo da estética da fanzine, assinado por Pedro Nora, as quase 400 páginas – maioritariamente a preto e branco – desta publicação contam a história do “Salão Olímpico”, bem como da exposição de Guimarães e Coimbra. Organizado por José Maia, um dos vários cúmplices do “Salão Olímpico”, o livro passa em revista o projecto através de uma entrevista – por este conduzida – com os seus membros, de uma reflexão de natureza sociológica de Sandra Vieira Jurgens e da documentação visual, acompanhada por pequenas notas, escritas por Gisela Leal, acerca das múltiplas exposições realizadas e das obras expostas em “Busca Pólos”. Apesar de o ensaio abordar, superficialmente, demasiados temas, deixando por aprofundar a trajectória, os objectivos e o impacto do “Salão Olímpico”, e de as sinopses serem muito descritivas e pouco analíticas, ambos os contributos constituem uma mais-valia crítica. Esta é excelentemente complementada pela conversa com os membros do “Salão Olímpico” que, embora descurem alguns assuntos polémicos que marcaram a sua existência e recentes debates suscitados pela associação às duas instituições promotoras de “Busca Pólos” e do próprio livro, traçam uma panorâmica não só sobre a sua experiência mas também sobre as vicissitudes do fazer artístico em Portugal.
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O livro completa-se com imensos documentos – como a reprodução integral das revistas editadas pelo “Salão Olímpico” – e outros textos. Infelizmente, estes pouco concorrem para a sua qualidade: desde as diletantes divagações por assuntos marginais ao tópico do livro, protagonizadas por Ricardo Nicolau e João Sousa Cardoso, até à ininteligível introdução de Ivo Martins, programador do Centro Cultural Vila Flor, pouco mais há a aproveitar na publicação em termos de ensaística. Resta, então, dar palavra aos artistas para resgatar o livro desta falta, pois foi sempre deles a melhor voz: “Estávamos, e continuamos, interessados na singularidade do discurso que cada artista e cada obra nos propõe. (…) Para mim isto tem sido um trabalho de fé, de amizade e de compromisso com os meus amigos e com o meu tempo”
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L+ Arte (Livros & Net), nº 43
Dezembro 2007
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1 comentário:

Manuel Santos Maia disse...
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