14 setembro 2007

Rise and Shine por Carla Filipe

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Rise and Shine
(Get out of bed and prepare for work)
de Cristina Regadas
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3 séries

No trabalho de Cristina Regadas o uso da fotografia e do desenho é recorrente, nesta exposição “Rise and Shine“ o desenho é-nos dado através da fotografia. Muitas das questões levantadas sobre o problema da transferência do objecto do atelier para o espaço expositivo, até que ponto ele se altera, neste caso a sua transferência é dada pela fotografia. Os retratos das Divas: Françoise Hardy, Anna Karina, Mia Farrow e Brigitte Bardot, desenhados a lápis de cor e aguarela, permanecem no espaço atelier-casa, não recorre a uma representação desse espaço no local de exposição. Uma das frases que Cristina Regadas me disse sobre a forma como apareceu este trabalho: “Na altura em que comecei o trabalho não tinha a percepção de que estive tanto tempo em casa, dei-me conta mais tarde que passei meses a ver filmes, a ler os mesmos livros várias vezes. Parece ter sido um período de convalescência.” Dentro das várias possibilidades de trabalhar, uma é quando o trabalho aparece através de uma vivência, especialmente para quem trabalha em casa, a vida, o quotidiano fundem-se com a criação. Por vezes não há planos ou um método de trabalho consciente. Este surge paralelamente ao processo.
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Sobre as séries:
As divas.
Os retratos escolhidos pertencem ao carácter de ídolos do nosso imaginário colectivo, personificadas pelo cinema, que nos dá conhecimento das emoções e das experiências. É uma economia sentimental.
Um retrato da Brigitte Bardot leva-nos ao “ Desprezo”, como Mia Farrow a "Rosemary's Baby", estes rostos têm dissolvido o conteúdo da sua personalidade através do cinema. A maior parte dos filmes seleccionados passam-se dentro da casa. Mas também têm outra coisa em comum- a beleza, todas estas pessoas ainda estão vivas mas permanece na memória pela beleza da sua juventude, a sua força atractiva, se o sublime é infinito a beleza é mortal. As celebridades desvanecem-se e ao redesenhar está a inscrevê-las na nossa memória. Uma resistência à perda.O acto de desenhar é vivêncial leva-nos a uma liberdade, está-se mais próximo à personagem, cria-se uma espécie de cumplicidade. As celebridades desvanecem-se e ao redesenhar está a inscrevê-las na nossa memória. Uma resistência à perda.
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Sobre a casa:
A identidade nunca é fixa, tem de ser construída, a casa é um lugar que contém uma iconografia que nos caracteriza, emocional, de afectos, de interesses. São territórios emocionais e geográficos. É o território a que nos pertence dentro da cidade, quanto maior é a cidade maior um período de incubação, também é através dela que temos a dimensão do mundo, um espaço de discurso privado-público, coloca-nos num falso ponto de partida, é antes um estar, assume-se do que é exterior nos pode oferecer, o que poderá tornar-se possível. Basicamente é preciso existir um espaço para as nossas obsessões e interesses, que neste caso é a casa. A série das fotos das janelas assume esse olhar para o exterior, aliás um duplo olhar, porque também nos é mostrado do interior para dentro. Tal como no cinema temos o olhar da câmara e o da personagem. Aqui nada mais é mostrado do que a vista através da janela, não há informação que nos situa para além da abertura.
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Sobre a fotografia:
É assumido um compromisso duradouro com esta tarefa, fotografar sempre o mesmo até seleccionar a imagem. A fotografia marca um presente, situa-nos.O rolo fotográfico tende a durar e a ter as suas conseqüências derivado à erosão do tempo, Cristina Regadas usa máquinas e rolos antigos que sugere essa erosão. Sugere o inevitável: a perda da imagem. As máquinas: Holga e Zenit, dos anos 70/80, captam a imagem com erros próprios da imagem, evidenciando a ideia do simulacro, e reforça a sua obsolência imediata.O rolo só pode ser usado uma vez, tem de haver um acto decisivo no olhar e a espera da revelação do rolo para relembrar esse presente. Esta espera pertence ao quotidiano da imagem analógica. A Foto é reconhecida por uma significativa importância, são provas directas o mais próximo ao negativo, à origem da imagem. Se por um lado estas máquinas fotográficas têm um valor no mercado simbólico, por outro é cada vez mais difícil obter os filmes, e a sua revelação e ampliação mantendo as características da imagem próprias da máquina. O comércio tende a ajustar toda a imagem a um modelo standardizado. Estas imagens não são uma resistência à tecnologia mas sim à criação de uma individualidade, de uma identidade fotográfica.
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O auto-retrato:
Se na série das divas são retratos, no auto retrato tapou-se a cabeça. Existe uma anulação da identidade dando lugar às outras imagens- identitárias. É um retrato em Polaroid por uma satisfação instantânea do auto-retrato. Também é a única foto em que foi necessário um terceiro, a casa abriu-se ao exterior.
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Este é o meu ponto de vista
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Carla Filipe, 2007
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3 comentários:

Lis disse...

Interessou-me.

isabel carvalho disse...

Isabel, já tens fotos de Viseu?
Só dois dos 3 espaços!
Bom trabalho para todas/os,
bjinhos

ps. tenho as tuas cartas da casa sincera aqui no atelier, se as quiseres marca um café, oka?

isabel ribeiro disse...

...as cartas chegaram ao destinatário, parece-me um pouco anti-natura voltarem ao remetente...